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Não é apenas um filme!




“…não são pedras que produzem filme, mas seres humanos que vivem em sociedade”(Alexander Martins Vianna).
“Tudo isso, porém, não obscurece o fato de que a chamada Sétima Arte seja, antes de qualquer coisa, um produto. Apenas um produto. Um produto feito para consumo dentro da indústria do entretenimento”(Francisco Giovanni Vieira)
O filme é um produto, mercadoria, valor de uso e valor de troca. A produção desta mercadoria específica exige investimentos – público e/ou privado – e envolve uma gama de indivíduos para além dos atores, figurantes e direção. Implica, portanto, utilização de força de trabalho e expectativa de lucro para os produtores e financiadores.
Em geral, não nos damos conta disto. Talvez seja insensato intuir que o espectador reflita sobre fatores para além do filme no momento em que o assiste. Afinal, em geral as pessoas não vêem filmes para analisá-los e se restringem à aparência. O próprio exercício de análise do filme a posteriori pode se revelar uma atividade não muito encantadora.
De qualquer forma, as vezes me surpreendo. Outro dia, por exemplo, fiquei a pensar sobre a quantidade de patrocinadores do filme Olga. São grandes empresas e corporações públicas e privadas. A ironia é que se trata da história de uma comunista, alguém cuja ideologia pressupunha a abolição da propriedade privada. Como é possível? Simples, o Capital transforma tudo em mercadoria de consumo, até mesmo produtos culturais críticos. Não por acaso, a contracultura é assimilada e mercantilizada.
Por outro lado, o cinema, a exemplo da literatura, é uma representação da realidade – mesmo o gênero documentário. Ainda que o filme não trate de temas históricos, políticos, etc., mas apenas das questões afetivas, cotidianas, ele representa a realidade humana e produz o efeito de nos identificarmos com os personagens que vivem dramas humanos – que amam, sofrem, se alegram. Ou, o contrário, de rejeitarmos com veemência, pois tais personagens expressam características humanas abomináveis.
Esta sensibilidade talvez explique porque, muitas vezes, ao assistir a um filme, a razão fica “suspensa”. Não necessariamente ausente, mas parece ficar num plano secundário. Ao nos concentramos diante de um filme, parece que assumimos outra racionalidade determinada pelas imagens, os diálogos, a música, etc. O filme toma corpo e parece “existir” enquanto realidade e não representação desta. Por instantes, a ficção dá lugar ao real. A história, seus personagens, parecem “reais”. Então, ocorre um processo interessante: passamos a interagir emocionalmente com o que vemos e ouvimos na tela. Sentimos raiva e até choramos. Ao suspendermos a razão, acreditamos no que nossos olhos vêem e nossos ouvidos escutam. E passamos a raciocinar em torno do filme, assumindo uma outra racionalidade mesclada com os sentimentos que perpassam nosso ser. A “razão externa” ao objeto – o filme – dá lugar à “razão ilusória” produzida pela atitude de espectador. O efeito deste envolvimento pode prolongar-se após o término do filme.
Estas observações tem como pressuposto a minha experiência. No entanto, recordo que certa vez, ao projetar o filme Danton: o processo da Revolução para uma turma de alunos, alguns passavam a impressão de acreditarem no que viam e ouviam. A “razão iludida”, às vezes mesclada a uma certa ingenuidade, faz com que o espectador não atente para o fato de que o filme é também uma interpretação dos fatos históricos, influenciado por interesses econômicos, políticos e ideológicos. É a versão do diretor e uma das possíveis interpretações da história. Em suma, é ficção e representação, ainda que histórica.

vivir


"A alma só começa a ter um conteúdo assinalável  
para além da cortina de pele que separa o dentro do fora.
E ela se enriquece infinttamente à medida que se anexa
aos círculos mais amplos em torno do ponto eu."

"Existir significa estár fora.
O que não existe insiste.
Insiste para existir. 

Ex-sistere."


"O que mais o repugnava não era tanto a brutalidade,
o ódio e a ganância que estes homens civilizados e 
altamente honoráveis demonstravamcom inocente tranquilidade. 
Ficava sempre a possibilidade de imaginar outros homens que, 
no lugar destes, fossem amáveis, indulgentes e generosos. 
Para Robison o mal era bem mais profundo. 
No seu íntimo, reconhecia-o na irremediável relatividade 
dos fins que via a todos perseguir febrilmente. 
Pois o que todos tinham como objetivos 
era tal aquisição, tal riqueza, tal aquisição. 
mas porque esta aquisição, esta riqueza, esta satisfação? 
Por que vives tu?"