Páginas

Cultura - Utopia e esperança

Estamos assistindo, no Brasil, a uma confusão no espírito da cultura. O empobrecimento intelectual é crescente, a nova orientação segue a trilha do capital e o mercado é apresentado como um dos principais pilares dessa interpretação. O resultado não é a mobilização das massas, ao contrário, a “cultura de resultados” impõe o aprofundamento da competitividade para ver quem comandará a produção dos novos totalitarismos.
O que interessa ao Brasil são as formas de extensão contínuas. Pensar as chamadas políticas públicas de cultura modernizando os equipamentos técnicos para beneficio exclusivo de um pequeno grupo de gestores é o caminho mais eficaz para se criar baluartes do individualismo na vida econômica da cultura. Os lugares, a sociedade e cada um de nos terá que sobreviver cada vez mais de um subsistema.
A identidade dos novos atores da cultura corporativa até então não era vista por nós. Agora, misturada ao Estado, finalmente aparece aos olhos de todos. A justificativa formal da cultura como bem de consumo no lugar das manifestações da sociedade, ganha na esfera federal entendimento conservador. Isso revela que frequentemente abandonamos a filosofia de políticas públicas e nos afastamos cada vez mais da cidadania verdadeiramente universal.
Os apelos dos que defendem a cultura como o futuro modelo de mercado vão no sentido de que diversos paises utilizam tal forma de “receita” sem conflitos ou consequências éticas. A influência dessa filosofia já dá sinais de que certas regras estabelecidas contribuem para o exercício da força-bruta e não de reflexões e ações. Isso, ao invés de apontar para a democracia cultural, deve gerar no Brasil uma guerra de ideologias e um espaço banal para a cultura.
Os novos “macro-agentes” da cultura, desconhecendo as particularidades das classes emergentes, criam nessa nova fase de fabulações um consumidor antes mesmo de criar o produto. A tradução disso é especulação. Mas esses clichês para alguns clubes parecem mesmo tentadores na relação entre criação e autodestruição.
A pobreza atual desse negligente pensamento resulta de uma convergência de causas legitimadas pelas instituições e suas políticas empresariais. A inteligência imposta pelas firmas é movida por mecanismos, planilhas e imagens, logicamente com a conivência dos “intelectuais” contratados.
O papel dos intelectuais não é aceitar a ordem cultural globalizada, e sim, buscar uma ordem mais humana e não o fatalismo do capital como fator absoluto, tentando compensar com um projeto social, num plano sub-nacional, as lógicas de uma política neoliberal. A função de um intelectual é a busca incansada da verdade para que a cultura no território nacional seja o retrato dinâmico da sociedade. 
O mercado como motor único e, portanto, essencial para a cultura artística é agora discurso oficial. Uma visão que obedece aos cânones científicos das grandes corporações globais. Isso retira do Estado a tarefa política de proteger a cultura brasileira, o que obriga os intelectuais a discutirem uma solução que não seja a adesão automática imposta ao território brasileiro por uma política cultural baseada na economia internacional.
Os processos definidores trazidos como remédios pela economia global de cultura, são apresentados administrativamente pelo Estado como a moderna produção industrial. A nova administração da cultura é definida a partir dos debates internacionais. Tudo agora tem caráter transnacional e ocorre numa atmosfera moldada pelo pensamento único, secundarizando as realidades de cada país.
Essa triste prática, além de limitar o espaço geográfico da cultura brasileira, pensa e planeja políticas culturais respondendo diretamente aos gráficos que interessam à indústria que legisla sobre todo o nosso patrimônio artístico-cultural. Por isso a cultura agora, esta presa as categoria de bens e serviços perdendo seu caráter critico e mobilizador.
O sistema capitalista mundial sob o qual estamos construindo nosso periférico mercado cultural, não tem espaço para a participação dos pobres. Portanto, não serão realçadas ou estudadas as manifestações de baixo pra cima. Segundo Mário de Andrade a criação brasileira sempre teve nas manifestações das camadas deserdadas da sociedade sua principal porção modernista e, por estas transgredirem as regras estabelecidas, ou seja, sem a primordial característica do povo brasileiro, a cultura que manifestaremos na arena global, será algo residual, completado e sem realização criativa.
Estamos sendo levados a pensar que não há alternativa para o universo da cultura senão pelo mercado. Pela nova maneira de enxergar as condições históricas da cultura brasileira, tudo o que construímos e projetamos será realizado agora de forma unitária, distante da totalidade. Essa velha noção mais uma vez levará ao descrédito o discurso dominante, abrindo lugar para a utopia e a esperança.