“… Primeira versão, a de 1926, eu creio: um cachimbo desenhado com cuidado e, em cima (escrita a mão, com uma caligrafia regular, caprichada, artificial, caligrafia de convento, como é possível encontrar servindo de modelo no alto dos cadernos escolares, ou num quadro-negro, depois de uma lição de coisas), esta menção: “isto não é um cachimbo”
.…. A outra versão – suponho que a ultima -, pode-se encontrá-la na Alvorada nos antípodas . Mesmo cachimbo, mesmo enunciado, mesma caligrafia. Mas em vez de se encontrarem justapostos num espaço indiferente, sem limite nem especificação, o texto e a figura estão colocados no interior de uma moldura; ela própria está pousada sobre um cavalete, e este, por sua vez, sobre as tábuas bem visíveis do assoalho. Em cima, um cachimbo exatamente igual ao que se encontra, mas muito maior…….”
Será necessário então ler:” Não busquem no alto um cachimbo verdadeiro, é o sonho do cachimbo; mas o desenho que está lá sobre o quadro, bem firme e rigorosamente traçado, é este desenho que deve ser tomado por uma verdade manifesta…”
…não consigo tirar da idéia que a diabrura reside numa operação tornada invisível pela simplicidade do resultado, mas que é a única a poder explicar o embaraço indefinido por ele provocado…
Essa operação é um caligrama secretamente constituído por Magritte, em seguida desfeito com cuidado…….
separação entre signos liguísticos e elementos plásticos; equivalência de semelhança e da afirmação. Estes dois princípios constituíam a tensão da pintura clássica: pois o segundo reintroduzia o discurso (só há afirmação ali onde se fala) numa pintura onde o elemento linguístico era cuidadosamente excluído. Daí o fato de que a pintura clássica falava e – falava muito – embora fosse se constituindo fora da linguagem; daí o fato de que ela repousava silenciosamente num espaço discursivo; daí o fato de que ela instaurava, acima de si própria, uma espécie de lugar-comum onde podia restaurar as relações da imagem e dos signos…….
Magritte liga os signos verbais e os elementos plásticos, mas sem se outorgar, previamente, uma isotopia; esquiva o fundo de discurso afirmativo, sobre o qual repousava tranquilamente a semelhança. e coloca em jogo puras similitudes e enunciados verbais não afirmativos, na instabilidade de um volume sem referência e de um espaço sem plano…
….Nada de tudo isso é um cachimbo…mas um texto que simula um texto; um desenho de um cachimbo que simula o desenho de um cachimbo…(desenhado como se não fosse um desenho) …”…entre a parede e o espelho, que capta reflexos, e a superfície opaca da parede, que recebe apenas sombras, não há nada…em todos esses planos escorregam-se similitudes que nenhuma referencia vem fixar: translações sem ponto de partida nem suporte…
….a exterioridade, tão visível em Magritte, do grafismo e da plástica, está simbolizada pela não-relação – ou em todo caso pela relação muito complexa e muito aleatória entre o quadro seu título…….estranhas relações se tecem, intrusões se produzem, bruscas invasões destrutoras, quedas de imagens em meio às palavras, fulgores verbais que atravessam os desenhos e fazem-no voar em pedaços…
…..Magritte deixa reinar o velho espaço da representação, mas em superfície somente, pois não é mais do que uma pedra lisa, que traz figuras e palavras: embaixo não há nada. É a lápide de um túmulo: as incisões que desenham as figuras e a que mascaram as letras não comunicam senão pelo vazio, por esse não-lugar que se esconde sob a solidez do mármore……parece-me que Magritte dissociou a semelhança da similitude…
.…. A outra versão – suponho que a ultima -, pode-se encontrá-la na Alvorada nos antípodas . Mesmo cachimbo, mesmo enunciado, mesma caligrafia. Mas em vez de se encontrarem justapostos num espaço indiferente, sem limite nem especificação, o texto e a figura estão colocados no interior de uma moldura; ela própria está pousada sobre um cavalete, e este, por sua vez, sobre as tábuas bem visíveis do assoalho. Em cima, um cachimbo exatamente igual ao que se encontra, mas muito maior…….”
Será necessário então ler:” Não busquem no alto um cachimbo verdadeiro, é o sonho do cachimbo; mas o desenho que está lá sobre o quadro, bem firme e rigorosamente traçado, é este desenho que deve ser tomado por uma verdade manifesta…”
…não consigo tirar da idéia que a diabrura reside numa operação tornada invisível pela simplicidade do resultado, mas que é a única a poder explicar o embaraço indefinido por ele provocado…
Essa operação é um caligrama secretamente constituído por Magritte, em seguida desfeito com cuidado…….
separação entre signos liguísticos e elementos plásticos; equivalência de semelhança e da afirmação. Estes dois princípios constituíam a tensão da pintura clássica: pois o segundo reintroduzia o discurso (só há afirmação ali onde se fala) numa pintura onde o elemento linguístico era cuidadosamente excluído. Daí o fato de que a pintura clássica falava e – falava muito – embora fosse se constituindo fora da linguagem; daí o fato de que ela repousava silenciosamente num espaço discursivo; daí o fato de que ela instaurava, acima de si própria, uma espécie de lugar-comum onde podia restaurar as relações da imagem e dos signos…….
Magritte liga os signos verbais e os elementos plásticos, mas sem se outorgar, previamente, uma isotopia; esquiva o fundo de discurso afirmativo, sobre o qual repousava tranquilamente a semelhança. e coloca em jogo puras similitudes e enunciados verbais não afirmativos, na instabilidade de um volume sem referência e de um espaço sem plano…
….Nada de tudo isso é um cachimbo…mas um texto que simula um texto; um desenho de um cachimbo que simula o desenho de um cachimbo…(desenhado como se não fosse um desenho) …”…entre a parede e o espelho, que capta reflexos, e a superfície opaca da parede, que recebe apenas sombras, não há nada…em todos esses planos escorregam-se similitudes que nenhuma referencia vem fixar: translações sem ponto de partida nem suporte…
….a exterioridade, tão visível em Magritte, do grafismo e da plástica, está simbolizada pela não-relação – ou em todo caso pela relação muito complexa e muito aleatória entre o quadro seu título…….estranhas relações se tecem, intrusões se produzem, bruscas invasões destrutoras, quedas de imagens em meio às palavras, fulgores verbais que atravessam os desenhos e fazem-no voar em pedaços…
…..Magritte deixa reinar o velho espaço da representação, mas em superfície somente, pois não é mais do que uma pedra lisa, que traz figuras e palavras: embaixo não há nada. É a lápide de um túmulo: as incisões que desenham as figuras e a que mascaram as letras não comunicam senão pelo vazio, por esse não-lugar que se esconde sob a solidez do mármore……parece-me que Magritte dissociou a semelhança da similitude…